Há gente que já fala no fim do escritório, outros veem exagero na previsão. Mas o home office definitivamente ganhou fôlego na pandemia do novo coronavírus, e algumas mudanças podem ser duradouras.
“A centralidade do escritório acabou”, tuitou recentemente o fundador e presidente do Shopify, Tobi Lütke.
Já o chefe da Google, Sundar Pichai, planeja reembolsar em até 1.000 dólares os funcionários que compraram equipamento e móveis de escritório para trabalhar de casa durante a pandemia do novo coronavírus.
Analistas afirmam que o mundo do trabalho pode estar diante de uma grande mudança. “Depois da previsão sobre a ‘morte da distância’, em 1997, grandes cidades prosperaram como nunca antes”, diz o professor de geografia econômica Paul Cheshire, da London School of Economics. Agora elas terão que se ajustar para sobreviver, acrescenta.
Em 2018, uma pesquisa do Censo dos EUA revelou que apenas 5,3% dos americanos trabalhavam integralmente em home office.
O analista Rich McBee, presidente da empresa Riverbed, especializada em trabalho remoto, calcula que entre 15% e 20% das pessoas que trabalhavam no escritório não vão retornar depois da pandemia.
A empresa de consultoria Global Workplace Analytics estima que empregadores poderão economizar em média 11 mil dólares anuais para cada pessoa que fizer meio período de home office, principalmente por meio de aumento de produtividade, menores custos de instalações físicas, menor absentismo e rotatividade no emprego e melhor preparo para situações de emergência.
“Vamos certamente observar empresas que historicamente resistem ao home office em alguns casos reduzindo custos”, comenta Mat Oakley, da agência imobiliária Savills.
Quem trabalha de home office também pode estar disposto a receber menos. A empresa de serviços de conexão Log MeIn ouviu 2.200 trabalhadores em abril, nos Estados Unidos, e descobriu que 62% deles aceitariam um corte no salário para trabalhar de casa.
Cidades mais vazias
Um aspecto central na mudança é que as cidades podem esvaziar, prédios comerciais poderão ficar abandonados e novos prédios comerciais poderão nem ser construídos. Por outro lado, a velocidade e a segurança da internet terão que aumentar.
Estudos que avaliam o impacto ambiental da mudança ainda não são conclusivos, por exemplo sobre se o maior uso de eletricidade e internet em casa seria compensado pela diminuição do uso no escritório.
O home office também cria questões de espaço em casa e o problema da sobreposição de trabalhos profissional e doméstico. “Eles são divididos de forma desigual, e as mulheres acabam sobrecarregadas. O aumento da violência doméstica durante a pandemia é um alerta bem concreto”, diz o sociólogo Les Back, do Goldsmiths College, de Londres.
Outro aspecto é que a mudança certamente não virá para todos. Operários, enfermeiros, motoristas de ônibus e vários outros profissionais jamais terão a opção de fazer home office.
“A situação nas cidades já mudou. São os trabalhadores mal remunerados, frequentemente negros, que mais andam de transporte público e correm risco de contágio na pandemia, enquanto a classe média branca cuidadosamente evita ir à cidade. Penso que as cidades vão se tornar ainda mais divididas”, diz Back.
O transporte público, vital para o funcionamento das grandes cidades, enfrentará um grande desafio na fase pós-epidemia, principalmente no curto prazo. “Há uma necessidade de subsídios públicos ainda maiores”, observa Cheshire. Para ele, viagens de trabalho, aeroportos, centros de convenções hotéis enfrentarão dificuldades também no longo prazo.
Muitos preferem o local de trabalho
“Penso que estamos num ponto de virada. Há uma reorientação, uma recalibragem da relação espaço-tempo-vida social”, diz Back.”Poderemos ver profundas mudanças e algumas coisas poderão jamais ser como eram antes”, acrescenta.
“Se de fato adotarmos uma abordagem de home office, há implicações claras para as telecomunicações e a internet de banda larga, e mais ainda se conurbações avançarem sobre áreas rurais”, comenta a economista Rebecca Larkin.
Mas outros analistas afirmam que a ascensão do home office não vai acabar com os escritórios. “A história, e também a nossa pesquisa mais recente, mostram que o escritório não vai desaparecer tão cedo”, comenta o diretor de soluções corporativas da agência imobiliária JLL Neil Murray.
“O escritório vai manter sua importância como facilitador de inovação e colaboração e também de saúde, bem-estar e produtividade dos funcionários”, afirma.
Uma pesquisa da JLL diz que 58% dos trabalhadores sentem falta de seus escritórios, e esse sentimento é ainda maior entre os mais jovens.
Outra pesquisa, da empresa de arquitetura e design Gensler, afirma que apenas 12% dos trabalhadores querem trabalhar de casa em tempo integral, e 70% diz que gostaria de passar a maior parte do tempo no escritório.
“Há ampla evidência de que a concentração espacial de escritórios eleva a produtividade, considerando todos os demais aspectos. Isso vale não só na horizontal, mas também na vertical. Trabalhadores em prédios altos são mais produtivos”, afirma Cheshire.
Fonte: DW